17/08/23 - Matéria do Bom dia SP da TV Globo sobe a "Cracolândia no Centro de SP"
Contudo, entre esses coletivos há muita (muita!) experiência adquirida ao longo dos anos e muitos caminhos apontados para entender a dar um primeiro passo na resolução desse problema tão complexo. Os agentes públicos (maioria de homens brancos) com suas canetas/fuzis nas mãos insistem em não nos escutar - e continuam com suas “políticas públicas” pensadas dentro dos gabinetes, agindo de forma eleitoreira e/ou com interesses escusos (especulação imobiliária/segurança privada - milícias) endossada diariamente pelo Datena na TV aberta. Enquanto isso, pessoas (maioria pretas) morrem nas calçadas vítimas da polícia e/ou do abandono completo do Estado, moradores não conseguem dormir e o comércio fecha as portas.
Sem mediação nenhuma do Estado alguns moradores (pobres), no desespero das noites não dormidas e na sensação de insegurança vestem o manto do fascismo e pedem o extermínio de quem está na calçada e/ou encontrando na droga, único sobro de vida possível. Comerciantes desesperados fazem o mesmo e sem olhar um palmo na frente do próprio nariz acham que polícia e/ou a internação compulsória vai resolver alguma coisa. Acham isso há trinta anos. Tudo vira faroeste no centro de São Paulo.
Três décadas numa falácia de guerra às drogas. Uma política insana de extermínio. Se você vir ao centro e ficar 10 minutos aqui, perceberá que nem a metáfora de enxugar gelo dá conta. Não há metáfora que dê conta.
A “Cracolândia” é resultado no nosso racismo estrutural e da nossa imensa desigualdade social. O fluxo deve ser entendido com essa complexidade. Inclusive na singularidade de cada corporeidade. Não há soluções mágicas. A pessoa só sairá da calçada e/ou vício com afeto - vínculo e política pública (moradia-primeiro, saúde, assistência social, educação, geração de renda, cultura, etc) olhada pelo viés da redução de danos.
Mas isso parece pouco objetivo para quem está vivenciando os problemas nesse minuto – na urgência da vida.
Então, para que possamos dar um primeiro passo é preciso urgentemente parar de hipocrisia e criar um espaço de uso da droga. Criar um espaço de uso supervisionado com oferecimento de políticas públicas decentes. Com isso libera-se a via pública agora, os moradores conseguem dormir, os comerciantes conseguem trabalhar e, principalmente, a pessoa em situação de calçada e/ou usuário sai do ciclo vertiginoso de violência sistêmica que o Estado emprega.
Enquanto não tiver sala de uso de droga pública e políticas efetivas / afetivas com criação de vínculo, nada vai resolver. Absolutamente nada.
Teatro de Contêiner Mungunzá / Cia. Mungunzá de Teatro
Texto de Marcos Felipe